Avaliação Preliminar: o primeiro passo para identificar uma área contaminada
Etapa do serviço de consultoria ambiental exige pesquisa criteriosa e tem como resultado um relatório que aponta indícios de contaminação e orienta as demais etapas do processo de Gestão de Áreas Contaminadas (GAC), quando serão feitas coletas e análises de amostras
Uma área contaminada é sempre um problema a ser resolvido. Não pode ser ignorada. E mais cedo ou mais tarde, precisará ser remediada e legalmente resolvida. Alguns problemas são pequenos e fáceis de resolver, principalmente quando não há contaminação. Outros exigem recursos e uma grande operação de remediação ambiental. Para dimensionar a possibilidade de contaminação de uma área e o tamanho do problema, o primeiro passo é fazer um estudo chamado Avaliação Preliminar.
“Nessa etapa, identificam-se as áreas fontes potenciais de contaminação (ou mesmo fontes primárias de contaminação), embasando sua classificação como Área Suspeita de Contaminação (AS) e orientando a execução das demais etapas do processo de Gerenciamento de Áreas Contaminadas”, explica Aline Carrazza, gerente de projeto da BTX. Na entrevista abaixo, Aline compartilha seu conhecimento e experiência na identificação dessas áreas e apresenta detalhes e peculiaridades sobre o processo de Avaliação Preliminar.
Avaliação Preliminar: etapa do processo de Gestão de Áreas Contaminadas passa pela análise de mapas e identificação de atividades com potencial de contaminação na região. Foto: Fernando Cavalcanti/BTX.
P: O que é uma Avaliação Preliminar?
R: É uma das etapas prioritárias para o gerenciamento de áreas em processo de reutilização, em processo de desativação da atividade licenciada ou dentro do sistema de gestão ambiental de uma empresa. Esse estudo tem como objetivo caracterizar as atividades desenvolvidas e em desenvolvimento na área para constatar evidências, indícios ou fatos que permitam suspeitar da existência de contaminação dentro dos limites da área, ou em seu entorno que possam impactar o imóvel. Nessa etapa identificam-se as áreas fontes potenciais de contaminação (ou mesmo fontes primárias de contaminação), embasando sua classificação como Área Suspeita de Contaminação (AS) e orientando a execução das demais etapas do processo de Gerenciamento de Áreas Contaminadas (GAC), quando a área será investigada por meio de coletas de amostras dos meios de interesse, para os parâmetros definidos nesse estudo.
P: Quanto tempo demora a execução de um estudo desse?
R: Um estudo desse tipo tem diferentes tempos de execução, porque depende do histórico a se construir do imóvel, ou seja, uma área que tem um uso industrial desde 1900 até atualmente, e que passou por várias etapas de transformação de seus processos, vai demandar muito mais tempo do que um terreno que somente teve uma ocupação industrial que iniciou em 2010, e do nível de incerteza que se almeja. Ainda, depende-se de levantamento de dados públicos como plantas e documentos existentes em prefeituras e em órgãos ambientais, o que pode resultar numa demora maior, que depende da rapidez do órgão, ou até mesmo da complexidade da área. Mas, em geral, na cidade de São Paulo, realizam-se Avaliações Preliminares em um tempo aproximado de 90 dias.
P: Qual é a importância da Avaliação Preliminar no processo de identificação de áreas contaminadas?
R: É a etapa que embasa as próximas. Portanto, quanto mais dados forem avaliados nessa etapa, mais importante. Porque é a partir desse levantamento que se define o modelo conceitual inicial. Por exemplo, se na etapa da Avaliação Preliminar já se identifica uma área com atividades com produtos específicos, há o layout da área, onde é feita a marcação da atividade contaminante, define-se uma quantidade de pontos para coleta de amostras, meios e substâncias que serão analisadas na Investigação Confirmatória, que após executada, apontará a resposta se a área é contaminada ou não. Entretanto, se não se sabe para o quê a área era utilizada, quais substâncias armazenava e para onde um possível produto era levado na área, a Investigação Confirmatória passa a ter mais custo e mais incertezas, avaliam-se mais substâncias, ou, ainda, pode acontecer de se descobrir, já na etapa de obra, novas substâncias, gerando custos e tempo que não estavam previstos, podendo vir a inviabilizar o uso e a ocupação futura. Desta forma, de acordo com a quantidade de informações levantadas, é uma etapa em que se pode definir o tamanho do problema que será gerenciado. Caso contrário, quanto mais incertezas sobre os dados descobertos, mais custos e mais tempo para executar as próximas etapas.
P: Que casos curiosos foram descobertos em avaliações preliminares?
R: Quando estávamos avaliando uma área na Mooca, ao lado do Cotonifício, nos deparamos com o registro histórico do “Bombardeio Terrificante” que teve em São Paulo, em 1924. Nessa data, aviões passaram derrubando bombas pela cidade toda, atingindo inclusive fábricas famosas, como o Cotonifício Crespi, a Companhia Antarctica e os biscoitos Duchen. Historiadores dizem que SP nesse ano foi palco do maior conflito urbano da história do Brasil.
P: Custa caro fazer uma Avaliação Preliminar? Só empresas podem fazer, ou moradores de residências ou condomínios podem contratar esse serviço também?
R: Depende bastante, porque os valores também mudam conforme a complexidade do estudo. Entendo que as residências em geral não têm por que realizar uma Avaliação Preliminar, porque neste caso teria que haver uma suspeita de alguma fonte anterior; isso é difícil em uma casinha apenas. Agora, quando falamos de condomínios, tanto verticais, como horizontais, é possível sim recorrer a essa investigação, entretanto o correto a se fazer é a construtora ou incorporadora desse condomínio realizar esse estudo para saber se tem algum histórico de contaminação potencial antes da construção e entrega para as famílias. O mesmo raciocínio vale para casos de condomínios comerciais. Portanto, entendo que é mais importante as empresas responsáveis pela construção de condôminos solicitarem esse estudo e a conclusão do gerenciamento da área que eles irão ocupar.
P: Esse procedimento é composto por quais etapas?
R: Levantamento de documentos públicos, como prefeitura e órgão ambiental; levantamento de dados públicos como imagens aéreas, mapas topográficos, internet, juntas comerciais, matrículas, fotos históricas; dados do proprietário ou ocupantes, como plantas, memoriais de empreendimentos, vistorias em campo para constatar o que foi levantado nesses dados e entrevistas com os proprietários, ocupantes e vizinhos do entorno.
P: Como o relatório é organizado?
R: Existe o levantamento dos dados básicos do meio físico, como geologia, pedologia (ciência da gênese, morfologia e classificação dos solos) e hidrologia (ciência que estuda a água nos seus diversos estados, bem como de sua ocorrência, distribuição e circulação na natureza) e hidrogeologia; dados do uso e ocupação do entorno, imagens aéreas multitemporais do entorno, enfoque em áreas potenciais no entorno principalmente que podem vir a atingir o avaliado; avaliação de documentos de registros do imóvel, como matriculas, IPTUs, licenciamentos, plantas, layouts, vistoria e imagens aéreas multitemporais do imóvel e conclusões sobre as áreas fontes potenciais e suas características, definindo-se um modelo conceitual que vai ser classificado como procedimento da CETESB, em A, B e C devido ao seu grau de incertezas, sendo o A que se tem mais domínio da situação e C, quando se sabe muito pouco.
Inclusive, nosso método e execução foram bastante elogiados pela CETESB, que fizeram questão de nos enviar um e-mail para nos informar que o material de uma de nossas avaliações foi incluído num material de treinamentos do órgão.
Galeria de imagens históricas
Durante uma Avaliação Preliminar em áreas industriais na Mooca, bairro da Zona Leste de São Paulo, a equipe BTX resgatou imagens históricas que comprovam o terrível bombardeio que atingiu essa região da capital em 1924. Confira abaixo algumas das imagens que confirmam o cenário de guerra.
Incêndio nos armazéns Nazareth Teixeira & Cia, na Mooca, decorrente do bombardeio na cidade de São Paulo, em 1924. Foto: Wikipedia.
Registro de bombardeio que atingiu a Rua Caetano Pinto, na Mooca. Foto: Wikipedia.
Registro das Indústrias Matarazzo, após o bombardeio em 5 de julho de 1924. Foto: Wikipedia.
Tanques circulavam pela cidade de São Paulo durante “revolução esquecida” de 1924.
Prédios atingidos por granadas na rua Augusta em 1924 em São Paulo.
Fonte das imagens: Wikipedia